A teoria da tectónica de placas é uma teoria unificadora das ciências da Terra sólida. Teorias unificadoras correspondem a mudanças de paradigma que revolucionam a forma como compreendemos o mundo em que vivemos. Um outro exemplo de uma teoria unificadora é a teoria da evolução de Darwin. Esta implicou uma mudança radical na forma como interpretarmos o mundo biológico. A teoria da tectónica de placas correspondeu a uma mudança de paradigma que revolucionou a forma como compreendemos o planeta em que vivemos. No entanto, esta é uma teoria relativamente recente e, como tal, não totalmente consolidada. Ainda hoje persistem em diversos meios académicos elementos de teorias anteriores e de passos intermédios, como a deriva continental. É, portanto, fundamental conhecer o caminho que nos trouxe até aqui. Nas próximas publicações irei tentar contextualizar brevemente a teoria da tectónica de placas. Irei depois providenciar uma visão atual e explorar perspetivas futuras.
Antes de começarmos é importante arrumar alguns conceitos. O que é a tectónica? O que é a tectónica de placas? E o que é a teoria da tectónica de placas? A tectónica é uma disciplina científica que estuda o movimento e a deformação da superfície de planetas rochosos (por vezes também denominados de planetas terrestres ou silicatados). Apesar de ser tradicionalmente aplicada à Terra, hoje sabemos que todos os planetas rochosos, assim como as luas rochosas, têm algum tipo de tectónica, seja esta uma tectónica de impacto associada à colisão de meteoritos ou uma tectónica relacionada com a dinâmica interna do planeta. O que a Terra tem de especial é possuir um tipo particular de tectónica a que chamamos tectónica de placas. Neste sentido, podemos dizer que a tectónica de placas é um processo, isto é, um conjunto de eventos e interações que ocorrem de acordo com leis naturais e que podem ser observados, medidos e explicados de acordo com teorias e modelos científicos. A teoria da tectónica de placas é a teoria que descreve como este conjunto de processos tectónicos estão organizados e como estes se interrelacionam para dar origem à tectónica de placas. Na sua forma mais simples, a teoria da tectónica de placas descreve como a superfície do planeta Terra se encontra fragmentada em diversas placas tectónicas, semi-rígidas, que se movem umas em relação às outras sobre uma camada mais dúctil, a astenosfera. Cada placa é formada por crusta, que pode ser oceânica ou continental, e pela parte mais superficial do manto, o manto litosférico. Em conjunto, a crusta e o manto litosférico constituem a litosfera. Na sua origem, a teoria da tectónica de placas era uma teoria cinemática que descrevia como as placas se moviam através da superfície esférica da Terra. Nos anos imediatos à sua formulação, procurou-se ir mais longe e tentar compreender quais as forças que causam o movimento das placas. Atualmente, a comunidade científica encontra-se a desenvolver uma nova teoria que tenta integrar a tectónica de placas com a estrutura e dinâmica interna do manto. Estou cada vez mais convencido de que a tectónica de placas é um processo emergente que resulta da interação de processos complexos que ocorrem a diferentes escalas, desde a rede cristalina dos minerais aos grandes movimentos convectivos resultantes da instabilidade da litosfera. A tectónica de placas acontece porque as placas oceânicas arrefecem e se tornam mais densas, porque isto leva a mudanças na estrutura dos minerais, porque os minerais têm defeitos, porque estes defeitos permitem que as rochas fluam sem perder a sua coerência e porque existe uma memória no sistema. Isto é, os processos anteriores influenciam os processos futuros de forma irreversível. Neste sentido, a tectónica de placas é uma teoria termodinâmica. É neste ponto que nos encontramos hoje e ainda temos muitas questões científicas por responder. De onde vem a energia motriz dos processos tectónicos? Como é que estes evoluem no tempo? Como é que funciona a tectónica nos noutros planetas silicatados? Qual a relação entre a tectónica de placas e a vida? Uma última nota. É preciso não esquecer que a tectónica de placas é na sua essência uma teoria física (geodinâmica) da Terra, mas na qual os processos químicos e biológicos têm um papel fundamental. Disciplinas como a geodinâmica química e a biogeodinâmica desempenham cada vez mais um papel essencial na nossa compreensão da dinâmica da Terra. No entanto, eu gosto de relembrar que só há uma ciência! As caixinhas que inventamos e que a que chamamos “disciplinas” estão de facto profundamente interligadas e nunca compreenderemos os processos geodinâmicos fundamentais se não pensarmos de uma forma integrada e transdisciplinar. A ideia aqui é tentar explorar alguns destes conceitos de forma simples e acessível. Vamos a isso... Texto adaptado de Duarte, J.C., A teoria da tectónica de placas: uma perspectiva. APPBG. Imagem: Mapa baseado no trabalho de Marie Tharp and Bruce Heezen nos anos 50 do século passado. #geologia
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