Este mapa de Stern et al. (2016) mostra bem porque é que o sismo de 1755 nunca devia ter acontecido. Neste mapa estão assinalados todos os sismos com magnitude superior a 8,5 ocorridos entre 1687 e 2016. É possível observar que todos eles ocorreram perto de grandes zonas de subducção, com a exceção do sismo de 1950 na China (mas aqui podemos argumentar que é uma zona de subducção continental). A outra exceção foi o sismo de 1755. Este foi o maior sísmico registado em todo o Atlântico, Mediterrâneo e África, e ilustra bem que algo muito particular está a ocorrer na nossa margem. Para gerar um sismo como este (e um tsunami transatlântico) é necessário uma falha tectónica muito grande (com centenas de quilómetros) e um deslocamento do fundo do mar muito considerável (dezenas de metros). O problema é que nunca encontrámos uma falha com estas características. E pior. O sismo de 1755 não foi um único grande evento sísmico a ocorrer nesta zona. Em 1969 houve um outro sismo de grande magnitude (M7,9). E este ocorreu numa zona completamente plana da planície abissal, onde não há nenhuma grande falha mapeada. Isto levanta dois problemas. O primeiro é que mostra que ainda não sabemos muito bem o que gerou o sismo de 1755 (temos algumas ideias). O segundo é que provavelmente todos os mapas de perigosidade sísmica que estamos a usar, e tudo o que vem a montante (mapas de risco sísmico, normas de construção, etc), poderão estar errados. Ainda há muito por fazer e deveria haver muito mais investimento na ciência de base. Os sismos são cíclicos e sismos como estes vão voltar a acontecer. Só não sabemos se será daqui a umas décadas, ou logo à tarde. Mas nós hoje temos um dado precioso. O sismo de 1755 nunca devia ter acontecido, mas como aconteceu nós agora sabemos que irá voltar a acontecer. Os desgraçados que viveram em 1755 não sabiam disso. E isto dá-nos uma responsabilidade acrescida, como sociedade. Está nas nossas mãos decidir o que fazer com este conhecimento. PS1: Algumas coisas têm sido feitas. Muitas devido à carolice dos cientistas que continuam a dedicar-se à ciência com niveis de financiamento e estabilidade profissional muito baixos. PS2. Sismo como 1755 poderão não ser a única ameaça. Um sismo de magnitude 7 na Falha do Vale do Tejo, como aconteceu em 1531, será tão ou mais catastrófico. E o período de recorrência destes sismos é muito mais curto. #geologia #1755 Referência: Stern, R.J., Scholl, D., and Fryer, G. 2016. Convergent Plate Margin Hazards. Plate Tectonics and Natural Hazards. In Eds. Duarte, J. and Schellart, W., Plate Boundaries and Natural Hazards, Geophysical Monograph 219, AGU 77-98. https://doi.org/10.1002/9781119054146.ch4
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