1 de novembro de 2023. Faz hoje 268 anos que se deu um dos sismos com maior impacto na História. O sismo de Lisboa de 1755 ocorreu no dia de Todos-os-Santos, por volta da 9:40 da manhã quando parte da população se encontrava a assistir à missa no interior de igrejas. Muito dos tetos ruíram. A mistura de velas e interiores de madeira deram origem a fogos que duraram dias. Aqueles que conseguiram escapar, fugiram para a parte aberta da cidade, junto ao rio. Quarenta minutos depois do primeiro tremor, uma onda gigante subiu o Tejo e inundou a parte baixa da cidade. O sismo terá tido uma magnitude superior a 8,5. As estimativas variam, mas terão morrido dezenas de milhares de pessoas. A destruição instantânea de uma capital europeia deu origem a uma onda de choque que alastrou pelo mundo ocidental. Os filósofos da altura, ao estudarem as causas dos sismos, abriram caminho para aquilo que hoje chamamos sismologia. Há até quem considere que foi aqui que teve início as ciências da Terra como disciplina científica. Terá sido 1755 um evento único? Qual a sua explicação? Se olharmos para o mapa (Hensen et al., 2019), vemos que só no século XX ocorreram, entre Portugal continental e os Açores, três sismos de magnitude perto ou superior a 8 (1941, 1969 e 1979). O primeiro teve mesmo uma magnitude de 8,4. No entanto, há quem considere que o maior perigo poderá não vir do mar, mas sim do interior do território continental, na zona do Vale do Tejo. Em 1531, ocorreu aqui um sismo de magnitude estimada de ~6.5, que terá tido uma intensidade máxima de X em Benavente (ver figura Miranda et al. 2012). Em 1909, um sismo de magnitude 6,0, na mesma zona, terá causado cerca de 70 vítimas. O chamado sismo de Benavente, atingiu uma intensidade de X, a mesma registada em Lisboa durante o sismo de 1755, mas num raio muito mais pequeno. Hoje, um sismo de magnitude 6,5 junto a Lisboa poderia ser catastrófico. Com estes exemplos, quero chamar a atenção para o facto de só nos últimos 100 anos terem ocorrido 3 sismos de magnitude perto de 8 ao largo da costa portuguesa, 2 sismos de magnitude 7,1 e um sismo em terra com magnitude 6. A ideia de que os sismos grandes só acontecem a cada 200 anos é um mito urbano. A dura realidade é que sismos de magnitude 6 a 8 ocorrem várias vezes por século e podem ocorrer a qualquer momento. O problema é que a nossa memória é curta. (ver imagem Custódio et al., 2015) E, porque há sismicidade? Portugal encontra-se numa zona de fronteira entre duas grandes placas tectónicas: a África e a Eurásia. Estas placas estão em rota convergente, o que leva à acumulação de tensão que é ciclicamente libertada sob a forma de grandes sismos. Estes causam a deformação da crusta, e é assim que as nossas montanhas vão sendo construídas, pouco a pouco. No entanto, ainda hoje se desconhecem as falhas que terão causado os sismos de 1755 e de 1969. Estas localizam-se a grandes profundidades no interior da litosfera. Por exemplo, o sismo de 1969 terá ocorrido a cerca de 30 km de profundidade. Nesta zona, a profundidade do mar é de cerca de 5 quilómetros, o que torna o seu estudo bastante complicado. Estudos recentes, mostraram também que a nossa margem poderá estar a ser reativada e a transformar-se numa margem ativa, o que explicaria a sismicidade de grande magnitude, da mesma ordem de grandeza da que se observa no famoso Anel de Fogo do Pacífico (ver imagem, Stern et al., 2016). Dada a perigosidade sísmica a que estamos expostos, e o seu desconhecimento, será preciso fazer muitos mais estudos, quer no mar, quer em terra (a falha do Vale do Tejo também é relativamente desconhecida). Alguma coisa tem sido feita, mas não chega. Neste momento o IPMA tem um sistema de alerta de tsunamis operacional e vão ser instalados sensores sísmicos na nova geração de cabos submarinos, que atravessam a fronteira de placas em dois sítios. Também há muito por fazer no que toca a construção sismo-resistente e à sua fiscalização. Não nos devemos alarmar, mas nunca é demais recordar que em 1755 ocorreu ao largo de Portugal um dos maiores sismos da história e que este não foi um evento único. #geologia Referências: Hensen et al., (2019): https://doi.org/10.3389/feart.2019.00039 Miranda et al. (2012): https://www.iitk.ac.in/nicee/wcee/article/WCEE2012_0685.pdf Custódio et al. (2015): https://doi.org/10.1093/gji/ggv285 Stern et al. (2016): https://agupubs.onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/9781119054146.ch4
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